Resenha: SUN TZU. A Arte da Guerra. 1.

 



Livro:                   A Arte da Guerra

Autor:                  Sun Tzu

 

Resenha por:    Gerson Anderson de Carvalho Lopes

 

               O livro favorito deste resenhista! Sim, quando se tem mais de dez edições do mesmo livro e todo ano volta-se a fazer esta mesma leitura pelo menos uma vez, é fácil dizer que este é o livro favorito. Conheci este livro por volta de 2010, na Escola de Filosofia Nova Acrópole de Macapá, através do professor Cleverson Barata, um filósofo e artista marcial que por seis anos foi o mais próximo que tive de um mentor, pelo menos nessa etapa inicial dos meus caminhos em filosofia e artes marciais (que, por sinal, eu começaria a praticar no ano seguinte). Li o livro algumas vezes, ao todo ou em partes, e sempre que via uma edição em um sebo, livraria, ou mesmo pela internet, fazia questão de comprar, por isso tenho várias, em diferentes tamanhos, capas, traduções, estilos gramaticais e linguísticos, com e sem ilustrações, comentários etc.

A Arte da Guerra é um livro extremamente profundo e sintético que consiste num verdadeiro manual da arte militar, escrito por um general chinês há cerca de 2.500 anos. Desde então foi considerado por muitos o melhor manual de estratégia já escrito e inspirou gerações de líderes por toda a história e por todo o planeta. Seu campo de influência superou o âmbito militar em si e tem sido aplicado à gestão de empresas, aos estudos, às finanças domésticas, aos esportes, ao domínio interior, à psicologia e muitos campos. Não é à toa que ainda hoje novas edições continuam surgindo sempre e sempre são vendidas.

Entretanto, com essa profusão de gente escrevendo sobre a arte da guerra aplicada nos mais diversos contextos, um se baseando na tradução de outro e interpretando à sua maneira os ensinamentos, afirmar com certeza um significado é uma tarefa um tanto perigosa. Da mesma forma que ocorre com outros livros antigos, inclusive os livros sagrados de várias religiões, e ainda agravado pelo distanciamento linguístico no nosso caso como leitores brasileiros, é importante ser crítico em relação à leitura e não aceitar tudo exatamente como está escrito. Porém, pela própria concisão e clareza do texto de Sun Tzu, é possível extrair muito ensinamento desta obra sem necessariamente uma formação literária ou vocabulário específico prévio.

               No ano de 2022, após realizar, na época, meu exame do 2º para o 3º estágio no estilo de kung fu Shaolin Chih Chang na academia AFLS de São José do Rio Preto, falei ao meu instrutor de kung fu em São Carlos, o hoje Si Sok Gabriel Lopes, que pretendia escrever uma resenha desse livro. A edição que eu acabara de ler àquela altura era a da editora HB, parte da coleção Estratégia Chinesa, de 2011, reimpressão de 2014, 160 páginas, com tradução de Neury Lima a partir da edição inglesa de Lionel Giles M. A. (1910), que traduziu o livro a partir do chinês. Porém os afazeres do meu curso de doutorado (e, sendo honesto, minha falta administração do tempo) fizeram com que só conseguisse escrever essa resenha agora. A motivação para a retomada desse projeto foi que, retornando de São Paulo para São Carlos após participar de um evento, acabo de adquirir mais duas edições deste livro, que eu ainda não tinha, as quais li durante a viagem mesmo.

               Estas edições que adquiri por último são: uma da editora Camelot, de 2023, ilustrada e que traz também audiobook, com tradução do Instituto Brasileiro de Cultura, 79 páginas; e outra da editora Veríssimo, também de 2023, com tradução de Rafael Arrais, com base também na versão inglesa de Lionel Giles, 96 páginas. Por serem curtos e por eu já conhecer o cerne do texto, foi fácil de ler ambos nas 3 horas e meia de viagem.

               A Arte de Guerra possui 13 capítulos que tratam dos principais fatores que regem a prática militar e da questão central de como gerenciar um exército de modo a vencer todas as batalhas, do modo mais eficiente possível, com o mínimo de perdas, sem movimentos ou ações desnecessárias e no menor tempo possível. Em mais de uma oportunidade, o autor até mesmo afirma que a melhor vitória é aquela que se obtém antes mesmo de desembainhar a espada, o que ele chama de vencer sem lutar, a supremacia da inteligência, da diplomacia e do planejamento sobre a ferocidade impulsiva e a força bruta.

Entre os tópicos principais do livro estão: conhecer a si próprio e ao adversário é a chave para o sucesso, não importa o número de batalhas; não prolongar o conflito, resolver da forma mais breve possível; ser reservado quanto aos seus planos e objetivos; conhecer os fatores do ambiente em que a batalha se desenvolve; ser versátil e adaptar-se sempre à situação, variando as estratégias de acordo com as condições do combate. Essas foram as estratégias que tornaram o livro tão popular entre os líderes ao longo da história.

               Altamente controverso em mais de um momento, Sun Tzu fala sobre mitigar as forças do adversário e atacá-lo diretamente somente quando ele estiver enfraquecido, buscar o ponto fraco do oponente, que é o primeiro ponto a ser atacado, saquear as provisões do inimigo, nutrindo-se dos recursos dele em vez do seu próprio, enfraquecer as alianças do inimigo através da manipulação de informações a respeito dele, visando desmoralizá-lo, capturar algo que o inimigo preza, para força-lo a aceitar os seus termos e, inclusive, utilizar-se de espiões para obter informações confidenciais do adversário.

Se estas últimas táticas parecem covardes, desonrosas ou até injustas, e deixam o leitor perplexo, eu trago uma coisa que aprendi do meu mentor mencionado no início do texto: a ética de guerra não é a mesma ética dos tempos de paz. Certas atitudes, por mais contrárias à boa conduta que sejam, podem ser a melhor atitude quando se trata de encurtar ou evitar um conflito maior. Ressalto que ao falar de guerra estamos tratando de um caso extremo com o qual nós Brasileiros não estamos acostumados (felizmente), pois tivemos poucas guerras na história, já bem distantes de nós no tempo. Por isso, creio, para boa parte de nós é difícil entender (ou aceitar como válidos) certos trechos desse livro.

Ainda sobre a conduta ética, Sun Tzu mesmo deixa claro que o ponto de vista apresentado no livro é o do General, que visa apenas a vitória eficiente, que não é e nem deve ser o mesmo ponto de vista do Príncipe (ou do Governante), este sim deve se preocupar com o aspecto ético envolvido no ato de governar, pois representa o ideal de uma nação, os valores presentes e herdados de uma tradição, e as suas ações implicam num legado para as próximas gerações.

               Sun Tzu, afirmação minha, pode ser considerado um filósofo, uma vez que não trata somente de técnicas, mas também de princípios superiores que regem a arte da Guerra, de verdadeiras Lei que devem ser percebidas e obedecidas, e cujo conhecimento delas se dá por profunda observação, reflexão e motivação, seguido de uma disciplinada preparação e prática.

Exemplos disso são quando já no primeiro capítulo ele coloca a Lei Moral (em outras traduções o Tao, ou o Caminho) como o fator primordial que decidirá a batalha, antes de fatores como o tempo, o espaço, o método e a disciplina. Ou ainda nas palavras que ele dedica sobre a importância da honra e das virtudes que deve ter o General, a fim de conquistar a confiança e a lealdade de seus subordinados, assim como no destaque que ele dá à relação do conhecimento da natureza e dos acontecimentos do entorno para o sucesso em combate, isto é, aprender a ler os sinais da natureza para saber quando e onde atacar, ou mesmo quando não entrar em combate.

               Encerro dizendo que, seja qual for sua área de estudo ou trabalho, ou mesmo para lidar com questões da vida cotidiana, a leitura deste livro trará excelentes ensinamentos estratégicos que o ajudarão a planejar uma abordagem ao problema e que - quando bem aplicadas - levam inevitavelmente ao sucesso.

 

São Carlos, 24 de maio de 2024.

 

Conteúdo do Livro

 

Capítulo 1

               Cinco fatores são fundamentais da arte da Guerra: A Lei Moral, o Céu, a Terra, o Comandante, a Disciplina e Método. Em seguida são apresentadas as 7 perguntas que se devem fazer para avaliar e prever quem sairá vencedor no combate. Por fim, é discutida a dissimulação – a guerra baseia-se no engano – e o princípio de mitigar as forças do oponente a fim de ataca-o enfraquecido, de modo que a vitória é certa.

 

Capítulo 2

               A vitória deve ser rápida. Todo conflito por demais demorado é pernicioso. Deve-se fazer uma avaliação detalhada dos recursos disponíveis e do custo da guerra. Sempre que possível deve-se obter provisões, recursos, armas, veículos e tropas do próprio inimigo, através de saque e invasões, pois a guerra empobrece um país e deve-se evitar gastar seus próprios recursos.

 

Capítulo 3

               Deve-se buscar tomar o país inimigo inteiro e intacto. A invencibilidade está em si, e é uma questão de defesa, a vulnerabilidade depende do inimigo e é uma questão de ataque. A Política de guerra deve priorizar: atacar a estratégia do adversário, depois atacar suas alianças, por fim atacá-lo diretamente. Após isso discute-se os casos em que se deve utilizar as tropas e sobre o valor do comandante: ser claro nas ordens, saber o que fazer e quando agir, ter a confiança e a lealdade dos subordinados. Encerra-se o capítulo com a máxima de que aquele que se conhece e conhece o inimigo, em quantas batalhas entrar, sairá vitorioso.

 

Capítulo 4

               Inicia-se com uma lista dos erros de comando que o general deve evitar. Após fala-se das diferenças entre liderar o Estado e liderar o exército, as diferenças éticas de ser Príncipe e ser General. Explica-se diversas situações sobre quando atacar e quando defender e apresenta-se 5 detalhes importantes na arte da guerra.

 

Capítulo 5

               Inicia-se com a afirmação de que administrar um exército grande segue o mesmo princípio de administrar um exército pequeno. Em seguida o livro traz uma lista de táticas de inteligência e encerra afirmando que sempre que tiver uma posição de vantagem deve-se explorá-la, aproveitar as vantagens que se possui.

 

Capítulo 6

               As ideias principais do capítulo são: Buscar ocupar o campo de batalha primeiro; cansar o inimigo; explorar as vulnerabilidades do inimigo, ataca-lo no seu ponto fraco; ser misterioso, isto é, não deixar transparecer suas intenções ou objetivos; forçar o inimigo a se precaver, pois ao ter que defender vários pontos a defesa em cada ponto específico enfraquece; Sempre que possível, determinar o dia e a hora da batalha; criar as condições de vitória, transformar desvantagens em vantagem; fazer testes com combates menores para ver quais as forças e fraquezas do oponente.

 

Capítulo 7

               Princípios das manobras. Perigos durante a mobilização das tropas. O uso de objetos para comunicação em exércitos grandes: estandartes e tambores. Administrar o moral.

 

Capítulo 8

               Táticas militares com respeito ao terreno. Não contar com o erro do inimigo. As 5 fraquezas fatais do comandante.

 

Capítulo 9

               Conhecer as habilidades e talentos de todos os subordinados. Movimentações em cada tipo de terreno. Respeito e cuidado pela força da natureza. Ler os sinais da natureza assim como os sinais no comportamento do adversário.

 

Capítulo 10

               Os tipos de terreno. Discute-se as situações que levam à derrota. Por fim o autor mostra como conhecer a si mesmo e ao inimigo.

 

Capítulo 11

               Apresentam se várias táticas dependendo do tipo de terreno. Listam-se táticas mais antigas que Sun Tzu. Capturar algo que o inimigo preza. Em seguida o livro explica como guerrear em território inimigo. Evitar superstições e rumores. Não contar todos os seus planos e intenções aos subordinados. Lista do que é necessário ao general para comandar.

 

Capítulo 12

               Cinco modos de atacar usando fogo. Atenção ao clima para poder utilizar o fogo. Como saber o momento oportuno.

 

Capítulo 13

               Importância de saber os planos do inimigo. O uso de agentes secretos. Tipos de espiões. Como empregar os espiões.

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